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Experiência do adoecimento por doenças crônicas é tema de capítulo em coletânea da Ars Historica

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Sessão de hemodiálise em hospital público no Pará. Foto: Secom / via Fotos Públicas.

Por Carolina Vaz

O pesquisador do OHS Luiz Alves Araújo Neto  é autor de um dos capítulos do livro “Relações de poder, sociedades e ambientes: discursos e práticas no Brasil Império e na República”, coletânea organizada pelo Departamento de História da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Luiz Alves contribuiu com o capítulo VI, “Doenças crônicas e suas histórias: biomedicina, saúde pública e experiência do adoecimento”, que pode ser acessado na página 153 e a obra, que faz parte da série Ars Histórica, tem a organização de José Marcelo Marquei Ferreira Filho, Suzana Cavani Rosas e Cláudia Freitas de Oliveira.

No capítulo, Luiz Alves trata das doenças crônicas sob o aspecto da historiografia, traçando um percurso cronológico de como as enfermidades, antes chamadas de “degenerativas”, passaram a ser reconhecidas pela biomedicina, sociedade civil e outros campos. A quebra da relação “agente-ambiente-hospedeiro”, tríade que predominava na vigilância epidemiológica, impôs novos desafios à epidemiologia e mobilizou nova identificação de riscos para as Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT). Ao abordar a experiência do adoecimento pelas DCNT, o autor coloca em foco os aspectos da visibilidade, sobrevivência, convivência e risco.

Leia abaixo a Introdução do capítulo:

O campo da História da Saúde tem passado por transformações temáticas e metodológicas nos últimos anos, tanto devido a mudanças em seu perfil profissional quanto aos diálogos estabelecidos com outras disciplinas e pautas contemporâneas, a exemplo a relação entre saúde e Antropoceno. De modo geral, as agendas de pesquisa da historiografia da saúde no Brasil, embora abarquem ampla variedade em seus objetos e abordagens, têm se concentrado nos estudos sobre doenças agudas transmissíveis, com destaque para epidemias e endemias e seu papel na organização e desorganização do tecido social no país. Esse perfil responde a percursos institucionais e sociais que orientam as pesquisas históricas nesse campo, e é marcante e inegável a centralidade das doenças agudas transmissíveis na trajetória da saúde no Brasil, desde seu impacto epidemiológico até suas potências na formulação de projetos e interpretações para o país.

Nos últimos anos, entretanto, um conjunto bastante heterogêneo e complexo de enfermidades tem recebido maior atenção da saúde pública e da sociedade civil, bem como do campo acadêmico: as doenças crônicas. Além do crescimento considerável na morbidade e mortalidade por esses agravos desde as décadas finais do século XX, a carga de sofrimento imposta por elas e os desafios aos serviços e sistemas de saúde colocam as doenças crônicas como uma pauta relevante à investigação das ciências humanas, particularmente da História. Um relatório publicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2019 indicou que no Brasil, 8 das 10 principais causas de morte foram doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), com destaque para cardiopatias, cânceres, diabetes e o emergente mal de Alzheimer. No âmbito da prática e da gestão do cuidado, as crônicas ocupam cada vez mais os orçamentos público, privado e familiar, devido à demanda por intervenções mais complexas e prolongadas (portanto, mais caras) e às preocupações com os fatores de risco para essas condições. Finalmente, na dimensão da experiência das pessoas doentes, destaca-se o impacto em conviver com doenças de lento desenvolvimento, e muitas vezes sem possibilidade de cura, em situações que interferem na vida individual e coletiva de enfermas, mesmo quando curados/sobreviventes.

Apesar disso, o lugar ocupado pelas crônicas na historiografia da saúde brasileira é bastante incipiente e pontual, principalmente se observadas as DCNTs. Na discussão estrutural e estruturante referente a esse grupo de enfermidades, a cronicidade e suas reverberações em todas as esferas da vida social é uma pauta pouco discutida por historiadoras e historiadores da saúde, e mesmo quando abordada, aparece referida a doenças específicas. Em âmbito internacional, é possível vislumbrar uma agenda para uma história das doenças crônicas, com alguns autores que se debruçam sobre os processos que levam à conceituação desse grupo de enfermidades,5a relação entre a emergência das crônicas e a patologização do enve-lhecimento6 e as variações em termos de práticas e conhecimentos médicos. Ainda assim, coube a antropólogos e sociólogos da saúde uma análise mais detida sobre o conceito de cronicidade e suas transformações em termos temporais, especiais e sociais.Neste capítulo, proponho uma reflexão preliminar sobre uma história das doenças crônicas e sugiro alguns eixos e questões para investigação, pensando especificamente o contexto brasileiro e suas contradições e tensões. Argumento que o estudo das crônicas oferece um horizonte com novas questões para a historiografia da saúde, além de possibilitar o retorno a temas já consolidados no campo com outras perspectivas. Dada a complexidade da tarefa proposta, darei ênfase a três dimensões dessa agenda historiográfica: a produção do conhecimento biomédico, a organização e prática da saúde pública, e a experiência do adoecimento. Para tanto, um primeiro questionamento a ser abordado é: o que são doenças crônicas?

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