Dando continuidade ao Especial O Ministério da Saúde e o PNI, série de artigos da Casa de Oswaldo Cruz sobre os 70 anos do Ministério da Saúde e 50 anos do Programa Nacional de Imunizações, o OHS Recomenda de hoje traz o texto O contexto da Reforma Sanitária e a formulação do SUS do pesquisador José Roberto Franco Reis. Confira um trecho abaixo.
Especial O Ministério da Saúde e o PNI | O contexto da Reforma Sanitária e a formulação do SUS
José Roberto Franco Reis (COC/Fiocruz)
Conforme explorado por Fonseca e Hamilton no primeiro texto desta série, com a chamada Revolução de 1930 foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública (Mesp), uma demanda de setores da saúde que, ao menos desde os anos 1920, reivindicavam um Ministério. Em verdade o que se organiza neste momento é basicamente o que já se estruturava como Departamento Nacional de Saúde em 1920, cabendo à Educação uma fatia importante de funcionamento e atuação do referido Ministério. Momento inicial bastante conturbado, com três ministros diferentes ocupando a direção do órgão até a indicação de Gustavo Capanema em 1934, que permanece até o fim do Estado Novo, em 1945. A estrutura da saúde neste momento se organiza basicamente no Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP) – posteriormente Departamento Nacional de Saúde (DNS) – com o sanitarista João de Barros Barreto praticamente assumindo, a partir de 1937, todas as responsabilidades atinentes a esse campo. Uma das suas marcas fundantes, que perdurará por longo tempo com consequências importantes na estruturação das políticas voltadas para o setor, será o processo de cisão entre as atividades consideradas de saúde pública, vale dizer, ações coletivas de combate a endemias, epidemias e outras doenças contagiosas, e a assistência médica individual, atribuições respectivamente do Ministério da Educação e Saúde Pública e Ministério do Trabalho Indústria e Comércio (MTIC).
Apenas em 1953, no chamado Segundo Governo Vargas, como resultado da mobilização de médicos e sanitaristas que atuavam no serviço público e de certos interesses políticos, é criado um Ministério exclusivo para a saúde.
No entanto, a criação do Ministério da Saúde (MS) não representou um rompimento com o processo de cisão entre saúde pública e assistência médica individual, permanecendo tais ações inscritas em estruturas ministeriais apartadas. De fato, o que se observa é um paulatino processo de fortalecimento de ações voltadas à medicina previdenciária que “se amplia significativamente a partir de fins da década de 50 (…) e assume predominância a partir da segunda metade dos anos 60” (Braga e Paula, 1981, p. 52), em consonância com o avanço do processo de urbanização e industrialização do país de modo a preservar a saúde da força de trabalho urbana.
Especificamente no âmbito da saúde pública, nos anos 1950 se começa a observar uma crítica importante ao modelo hegemônico no setor, tido como “campanhista” e marcado por ações verticalizadas. Trata-se dos chamados sanitaristas desenvolvimentistas, defensores da proposição de que seria por intermédio do desenvolvimento econômico com prosperidade social que se alcançariam melhoras gerais nas condições de vida e, por conseguinte, também nas condições de saúde (Reis, 2015, p. 280). Ainda que não se observe na atuação dos sanitaristas desenvolvimentistas a defesa explícita de um processo de superação da cisão entre saúde pública e assistência médica individual, tinham a expectativa de implantar, como dito por um de seus maiores representantes, o sanitarista Mário Magalhães, “outro plano, outra política de Saúde Pública no Brasil” (Reis, 2015, p. 302). No entanto em março de 1964 veio o golpe civil militar de 1964 e interrompe bruscamente tal processo. O resultado foi a cassação ou perseguição das suas principais lideranças, bem como a completa desconsideração e abandono das suas proposições, com o aprofundamento da referida cisão e um retrocesso das tradicionais medidas de saúde pública, do que a epidemia de meningite de 1973-1974, ocultada durante bom tempo pelo governo militar, é um exemplo inconteste (Cardoso 2013, p. 111).
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