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Carlos Paiva fala ao Café História sobre os 30 anos da Estratégia Saúde da Família

Em entrevista ao Café História, o coordenador do Observatório História e Saúde da Casa de Oswaldo Cruz, Fiocruz, Carlos Henrique Assunção Paiva, conta como se consolidou a Estratégia Saúde da Família, que completa 30 anos em 2024. História mostra que saúde pública não resiste sem mobilização coletiva, força política e processos continuados.

Foto: Heitor Vilela (COC/Fiocruz).

Quando a pesquisa histórica encontra a saúde pública

De “Programa” a “Estratégia”. Criada há 30 anos como Programa Saúde da Família, a Estratégia Saúde da Família é hoje a principal ação do Ministério da Saúde no âmbito da Atenção Primária, ou Atenção Básica à Saúde, porta de entrada do Sistema Único de Saúde, o SUS. Com cerca de 37 mil Unidades Básicas de Saúde em todo o Brasil, a ESF representa um modelo de atenção voltada às necessidades da população brasileira e à pluralidade socioeconômica das regiões do Brasil.

Gestada no processo de redemocratização do país e nas discussões sobre a Reforma Sanitária que conduziu à criação do SUS, em 1990, a ESF hoje inclui atendimento ambulatorial para mais de 140 milhões de brasileiros, em quase a totalidade dos mais de cinco mil municípios brasileiros. São aproximadamente 50 mil equipes de Atenção Primária, Saúde Bucal, Agentes Comunitários de Saúde, Saúde da Família Ribeirinha, Saúde da Família das Águas ou Flutuantes, Consultório de Rua e Atenção Primária Prisional em ação no território nacional. “Neste nível assistencial, o cidadão tem encontrado em boa parte das vezes resolutividade para os seus problemas”, avalia Paiva.

Referência em pesquisas sobre a história da APS no Brasil, Carlos Paiva conta nesta entrevista como a ESF se consolidou ao longo dos últimos 30 anos. Coordenador do Observatório História e Saúde, que completa 20 anos em 2024, ele considera que a análise histórica, ao lidar com tradições, crenças e práticas instituídas, pode se apresentar como uma ferramenta importante para compreendermos os desafios colocados para diferentes problemas no campo da saúde. “A perspectiva histórica permite uma compreensão mais adequada acerca das soluções que estão em pauta para o enfrentamento de desafios institucionais do SUS, muitos dos quais históricos”.

A Estratégia Saúde da Família completou 30 anos em setembro de 2024. Podemos dizer que o processo histórico que gerou esta política de estruturação da Atenção Primária no Brasil, iniciado na década de 1980, teve como marco fundador o Programa Nacional de Serviços Básicos de Saúde, o Prevsaúde?

Eu não diria que o PSF teve como marco fundador o Prevsaúde. Embora tenha produzido um certo consenso técnico-político sobre a criação de uma política nacional de saúde com foco nos serviços básicos, ali na virada da década de 1970 para a de 1980, na prática, o alcance de Prevsaúde foi muito pequeno, para não dizer nenhum.

Inicialmente formulado em 1979 como uma ação conjunta dos ministérios da Saúde e da Previdência e Assistência Social, foi simplesmente engavetado nos primeiros anos da década de 1980, pois considerou a possibilidade de reforma do setor com a estatização dos serviços de saúde. Mas, como se diz, esqueceram de combinar com os russos, ou melhor, com o próprio setor privado, que àquela época já detinha uma considerável fatia do setor hospitalar brasileiro e era uma força política razoavelmente organizada. Vamos lembrar, por exemplo, que a Associação Brasileira de Medicina de Grupo, a Abrange, atual Associação Brasileira de Planos de Saúde, data de 1966. Portanto, os formuladores do Prevsaúde não estavam comprando uma briga qualquer. E perderam.

Daí em diante, a questão primeira, do ponto de vista de um movimento pela reforma sanitária, passava a ser muito menos a atenção primária e muito mais a implantação de um sistema de saúde unificado, o que seria efetivado no final da década de 1980 com a criação do SUS. Com a sua implantação no território brasileiro, a partir das chamadas Leis Orgânicas de Saúde, de 1990, veremos, aí, sim, com mais fôlego, uma discussão em torno de uma política nacional para a Atenção Primária à Saúde. Portanto, eu entendo que até os anos 1980 a APS ficou subordinada às discussões em torno da implantação de um novo sistema de saúde.

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