Especial 20 anos da SGTES: os principais desafios enfrentados pela SGTES em seus 20 anos

Compartilhe

Fonte: site da EPSJV/Fiocruz.

OS PRINCIPAIS DESAFIOS ENFRENTADOS PELA SGTES EM SEUS 20 ANOS

No texto anterior da série, tivemos oportunidade de contemplar algumas das principais iniciativas da SGTES com vistas ao enfrentamento dos inúmeros problemas que cercam a educação e o trabalho em saúde no Brasil. Os avanços são reconhecidos e mensuráveis a partir de uma ampla e diversificada literatura que tem se debruçado sobre ações, políticas e programas desenvolvidos pela secretaria ao longo das duas últimas décadas. Não se pode dizer, contudo, que os desafios estejam de todo superados. Pelo contrário, nos últimos anos, novos problemas e/ou antigos se intensificaram, transformando-se em foco de grande atenção por parte de técnicas(os) da secretaria.

Os desafios relacionados à fixação de profissionais de nível superior, principalmente médicas(os), e à inadequação entre o perfil de profissionais e as necessidades do sistema de saúde, conforme já sinalizamos, persistem como partes da agenda de trabalho da SGTES. A esses desafios, se somam novas questões, como as mudanças observadas no campo da educação profissional nas últimas décadas, com a crescente ampliação da participação da iniciativa privada, bem como a oferta de graduação na modalidade EaD, que introduzem ou intensificam a existência de novos obstáculos para a formulação e implementação de políticas para a educação em saúde.

No que se refere à gestão do trabalho em saúde se pode considerar que as dificuldades também são importantes, uma vez que essa área compõe um quadro que se relaciona diretamente com alguns dos principais desafios do SUS. A esse respeito, convém lembrar das importantes dificuldades que se colocaram com a reforma administrativa do Estado no contexto da década de 1990, com a Lei de Responsabilidade Fiscal de 2000 e com a própria intensificação do processo de municipalização do sistema de saúde no país. No seu conjunto, tais questões repercutiram na redução do espaço de intervenção do Ministério da Saúde na gestão e regulação do trabalho em saúde, reduzindo sua governança sobre as condições e vínculos de trabalho no SUS.

Um aspecto dramático, que se intensificou nas últimas décadas, diz respeito à escalada de desconstrução dos direitos trabalhistas, com profundas implicações para a garantia das condições dignas de trabalho para trabalhadoras e trabalhadores do SUS. O retrato desse processo envolve a multiplicação de formas de vínculo precarizado. De forma crescente se pode observar a prática da chamada “pejotização”, fenômeno segundo o qual profissionais de saúde são contratadas(os) como pessoas jurídicas, convertendo-se como “empresas” – o paralelo às(aos) “empreendedoras(es)” –, agora dedicadas(os) aos serviços públicos de saúde. Há, portanto, no campo da gestão e regulação do trabalho profissional uma forte demanda por soluções criativas para problemas que se intensificam, quando não se colocam como novos.

Aliás, entre os mais recentes problemas, podemos dar destaque ainda às questões que se colocam com o uso das chamadas novas tecnologias e inteligência artificial. Nas palavras de um dos gestores da SGTES:

“Outro ponto que cabe daqui para frente, é a discussão da incorporação de novas tecnologias e inteligência artificial. Novas metodologias de formação e tecnologias de trabalho […] O mundo da saúde está começando a substituir pessoal mesmo. Então, o redesenho das funções, dos trabalhos, dos escopos de práticas, é uma questão nem bem colocada ainda, mas eu acho que é uma coisa que vai acontecer nas especialidades médicas, essas coisas dos médicos fazerem tudo”.

A esses grandes desafios que retratam a trajetória da SGTES outros se somaram. Entre eles, as imensas incertezas institucionais colocadas no cenário das crises políticas que se instalaram no país a partir de 2013. No seu conjunto, elas imprimiram uma importante dificuldade de execução dos projetos, principalmente diante da instabilidade da relação entre o Executivo e o Parlamento Federais. Como assinala um outro gestor da secretaria:

[…] o ano de 2016 começou sem nenhuma capacidade de execução, por causa da crise instalada no Congresso Nacional […] a gente fazia planejamento de 15 em 15 dias. Porque a gente não sabia se depois de 15 dias estaria ainda no governo. Então isso prejudicou. Uma política como essa, que é estruturante, ela saiu do radar.

Por fim, cabe comentar como uma espécie de desafio original a própria inscrição da educação e do trabalho no campo institucional da saúde, tal como se expressou desde a conformação institucional da secretaria. Nesse ponto, conforme sinalizamos nos textos anteriores, precisamos reconhecer que não era de todo óbvio a todos que caberia ao Ministério da Saúde papel de liderança na formulação e implementação de políticas relativas à formação profissional em saúde e à gestão e regulação do trabalho profissional. Nas palavras de um quadro da SGTES:

“a própria criação da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde foi um problema com a burocracia no Ministério do Planejamento. Fazer o bendito decreto que cria: uma fotonovela. Como que o Ministério da Saúde vai se meter na área da educação? Daí baixou a burocracia […]. Foi uma negociação complicada no Ministério. A negociação com o MEC sempre foi problemática”.

Desse modo, podemos compreender que a história da SGTES está assim povoada por grandes desafios, que exigem sempre dos seus quadros técnicos e de inúmeras outras instituições parceiras ações à altura das dificuldades colocadas para a área e para o sistema de saúde brasileiro. Tenhamos em mente, portanto, que os desafios da SGTES, por assim dizer, são os desafios que dizem respeito ao próprio processo de efetiva implantação do SUS, segundo a formulação e os princípios doutrinários mais estruturantes da Reforma Sanitária. Assim, mesmo com os avanços institucionais já registrados, o caminho a percorrer jamais foi ou será livre. À frente os mais diversos interesses, perspectivas, organizações e, inclusive, projetos de sociedade em disputa. A história da SGTES é também uma história de lutas.

COMO CITAR ESTE ARTIGO

Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho em Saúde. Especial 20 anos da SGTES: os principais desafios enfrentados pela SGTES em 20 anos. In: FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Casa de Oswaldo Cruz. Site do Observatório História e Saúde. Rio de Janeiro, s/d. Disponível em: <https://ohs.coc.fiocruz.br/documento_de_trab/especial-20-anos-da-sgtes-os-principais-desafios-enfrentados-pela-sgtes-em-seus-20-anos/>. Acesso em: dia de mês de ano.