Foto: Araquem Pereira / Base Arch Fiocruz.
AVANÇOS E CONQUISTAS DA SGTES
Nos primeiros textos da nossa série, contemplamos algumas questões mais amplas, de fundo histórico, que contextualizam a criação da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES). Consideramos também alguns elementos do contexto político e social mais imediato que diz respeito à decisão de, em junho de 2003, por meio do Decreto nº 4.726, se criar uma secretaria no interior do Ministério da Saúde totalmente voltada para as questões relativas à educação, gestão e regulação do trabalho em saúde, de modo a conferir importante status institucional, no sistema de saúde brasileiro, para uma área cujas raízes mais próximas do solo remontam ao próprio processo de reforma sanitária.
Sem a pretensão de esgotar o repertório de ações e políticas consideradas relevantes ou com os resultados mais efetivos ao longo de seus 20 anos de existência, passaremos em revista de algumas políticas que costumam ser referidas por especialistas e gestoras(es) como importantes em uma perspectiva dos avanços registrados nessas duas últimas décadas de atividades da SGTES.
É bom termos sempre em mente que os desafios em torno da implantação do SUS no país, desde o início, foram enormes. No âmbito federal, a partir da agenda programática de governos liberais, fomos testemunhas de esforços em prol de uma reforma gerencial do Estado brasileiro que logo repercutiu em orientações conservadoras quanto aos gastos públicos, com impacto direto no funcionalismo público. De forma simultânea, a partir do processo de municipalização em curso, fomos testemunhas de uma verdadeira complexificação do mercado de trabalho em saúde. Já ao final dos anos 1990, por exemplo, os municípios tornaram-se os principais empregadores de trabalhadoras(es) para o SUS sem que houvesse um adequado parâmetro nacional que uniformizasse a gestão do trabalho em saúde no Brasil. Assim, as diferenças na capacidade de pagamento, atração e fixação de profissionais e distintas formas de vínculo empregatício e organização do trabalho imprimiam imensas discrepâncias locais e regionais, por vezes, estabelecendo uma inglória competição entre municípios abastados e os mais modestos em termos de financiamento e capacidade técnica e gerencial.
Nesse mesmo contexto, o campo da educação profissional enfrentou também importantes percalços. De um lado, assistimos a um crescente abrandamento da regulação e da vigência do interesse público no ensino superior; de outro, a esse fenômeno associado, uma importante expansão das instituições de ensino superior privadas na formação de trabalhadoras(es) no Brasil, inclusive no campo da saúde. Apesar das restrições regulatórias e da força do segmento privado na educação, na passagem do século, principalmente a partir da expansão da Atenção Primária à Saúde no país, fomos testemunhas de importantes iniciativas com foco na mudança do perfil qualitativo de profissionais de saúde vis-à-vis o novo modelo de atenção que se implantava. É nesse quadro que se implantavam os chamados Pólos de Capacitação em Saúde da Família (Pólos – PSF), implementados por meio de convênios entre as secretarias estaduais e municipais de saúde e Instituições de Ensino Superior.
A criação da SGTES, portanto, deu inegável impulso e solidez a essa agenda e outras consideradas estratégicas. Por exemplo, estamos testemunhando a reinstalação da Mesa Nacional de Negociação Permanente do SUS (MNNP-SUS); da publicação de Diretrizes Nacionais para a instituição ou a reformulação de Planos de Carreiras, Cargos e Salários no âmbito do SUS; da criação da Câmara de Regulação do Trabalho em Saúde e do Comitê Nacional Interinstitucional de Desprecarização do Trabalho no SUS (Desprecariza SUS). No seu conjunto, apesar das limitações quanto ao alcance de tais orientações e políticas, se pavimentava um caminho que incorporava tais questões na estrutura institucional do Ministério da Saúde. Nas palavras de um dos ex-gestores da SGTES:
“Acho que tem um eixo que é toda a política, de desprecarização, de formalizar as relações de trabalho, enfim, de conseguir retomar esta responsabilidade, do gestor encontrar e viabilizar mecanismos formais de contratação para superar a situação de desproteção que estava colocada[…] Tem uma ampla discussão que vai por aí, as mesas de negociação coletiva, e a tentativa importante de se estruturar um espaço de regulação profissional partilhado entre as profissões”.
No domínio da Educação, se pode chamar a atenção principalmente para a formulação e implementação, a partir de 2004, da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde, que passa a conferir sentido estratégico aos Polos de Educação Permanente em Saúde. O tema histórico da relação ensino-serviço é contemplado em iniciativas como o AprenderSUS, com instituições de pesquisa, e o VER-SUS, com o movimento estudantil. Nos primeiros anos de atividades da secretaria vimos, portanto, iniciativas que procuravam vincular graduandas(os) da área de saúde com a realidade vivenciada no SUS.
Sem descuidar das questões relativas ao ensino-serviço, até o final da primeira década de atividades, importantes iniciativas com vistas à reorientação curricular e pedagógica das graduações em saúde foram implementadas pela SGTES. Nessa linha, merecem destaque o Programa Nacional de Reorientação da Formação em Saúde (Pró-saúde) e o Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde (PET-Saúde), ambos dirigidos para as graduações em saúde. Voltado estritamente para a formação técnica, o Programa de Formação de Profissionais de Nível Médio para a Saúde (Profaps) merece ser igualmente destacado.
A partir de 2007, ainda com foco na formação profissional, institui-se a Rede de Escolas e Centros Formadores em Saúde Pública, um empreendimento que, num só tempo, fortaleceu e revelou a força da Saúde Coletiva como campo de conhecimento e de formulação de políticas. A construção da rede pode ser compreendida como uma importante contribuição para o desenvolvimento de ações integradas com foco no fortalecimento do SUS.
Próximo da segunda década de atividades, no contexto da primeira gestão de Dilma Rousseff (2011-2014), a SGTES passou a dedicar importante espaço para o tema da distribuição e fixação de profissionais de saúde no território brasileiro. Em 2011, com o objetivo de fixar médicas(os), enfermeiras(os) e dentistas na Atenção Primária à Saúde de municípios com maiores dificuldades de contratação de profissionais, foi criado o Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (Provab). Cerca de dois anos mais tarde, o Programa Mais Médicos convocava o tema de uma maior regulação do Estado sobre a formação e o mercado de trabalho de médicas(os), produzindo grande debate público no Parlamento, na imprensa e, principalmente, entre a própria classe médica. Suas contribuições se estenderam à ampliação de cursos e vagas de graduação em medicina e a um maior provimento de médicas(os) em áreas mais desassistidas.
Em que pese esse conjunto de relevantes iniciativas, aqui apenas sumarizadas, que sinaliza para avanços que merecem ser pontuados, os desafios relativos à inadequação da quantidade requerida e entre o perfil de profissionais e as demandas do sistema de saúde continuam de pé e representam agendas históricas que se reiteram no escopo de preocupações e atividades da secretaria. Se problemas tradicionais ainda não foram de todo superados, demandando da SGTES atenção por parte de suas técnicas e técnicos, novas questões emergem com força, ampliando o escopo de trabalho e atuação da secretaria. Conversaremos sobre alguns desses aspectos em nosso próximo texto!
COMO CITAR ESTE ARTIGO
Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho em Saúde. Especial 20 anos da SGTES: avanços e conquistas da SGTES. In: FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Casa de Oswaldo Cruz. Site do Observatório História e Saúde. Rio de Janeiro, s/d. Disponível em: <https://ohs.coc.fiocruz.br/documento_de_trab/especial-20-anos-da-sgtes-avancos-e-conquistas-da-sgtes/>.Acesso em: dia de mês de ano.