Fonte: reprodução https://www.unicef.org/brazil/media/9966/file/impactos-covid-criancas-adolescentes-ibope-unicef-2020.pdf
Continuamos, portanto, com um quadro dramático. Por um lado, milhões de brasileiros não possuem recursos para se alimentar e encontram-se em uma situação de carestia gravíssima. Por outro lado, outros tantos se veem sem a possibilidade de adquirir alimentos saudáveis e acabam consumindo em maior quantidade alimentos industrializados. Tais alimentos contribuem para a piora do estado de saúde, mas certamente pesam menos no orçamento familiar.
Nesse sentido, é importante destacar que o Direito Humano à Alimentação Adequada tem sido constantemente violado no Brasil, uma vez que nenhuma de suas dimensões está sendo cumprida. Enquanto isso, o poder público segue agindo de maneira modesta, sem uma política robusta que vise a redução do problema.
Olhe para a fome
No início do mês de abril foram divulgados os resultados do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil. O estudo é realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN).
O levantamento realizado no último trimestre de 2020 aponta que 19,1 milhões de brasileiros passam fome hoje no Brasil, o equivalente a 9,0% da população. Além disso, os dados também mostram que cerca de 55% dos brasileiros convivem com algum grau de insegurança alimentar.
Olhando para a história recente do país, é possível reconhecer ações que se mostraram fundamentais para a reversão desse quadro, entre os anos de 2004 a 2013. A centralidade dada ao combate à fome nas agendas de governo nesse período fez com que políticas públicas voltadas para esse objetivo fossem implementadas, garantindo a intersetorialidade necessária para que as ações tivessem o êxito esperado. Ainda que o problema não tenha sido erradicado, em 2013, 4,2% da população encontrava-se em situação de fome, o menor índice alcançado até então. Atualmente, os resultados do Inquérito nos mostram que regredimos aos patamares de 2004.
Fonte: Reprodução http://olheparaafome.com.br/
O inquérito também apresenta dois outros tipos de retratos da fome no país: o Mapa Geográfico da Fome e o Mapa Humano da Fome no Brasil. O primeiro sinaliza que no ano de 2020, dos 9,0% da população brasileira que passaram a conviver com a fome diariamente, 18,1% estão em domicílios da região Norte e 13,8% no Nordeste. Em termos absolutos, o Nordeste é onde se concentra o maior número de famintos, cerca de 7,7 milhões de brasileiros.
O segundo, o Mapa Humano da Fome, mostra a influência de questões de raça, gênero e escolaridade na situação dessas famílias. Em 2020, 11,1% dos lares chefiados por mulheres passavam fome. Quando comparados com aqueles chefiados por homens, esse número caiu para 7,7%. No recorte de raça, 10,7% das casas habitadas por pretos e pardos se encontravam em situação de fome, contra 7,5% daquelas habitadas por brancos. Por fim, quando o tema é escolaridade, 14,7% dos domicílios cujo chefe de família não tinha nenhum grau de escolaridade, ou possuía ensino fundamental incompleto, conviviam com a fome. Esse número caiu para 4,7% quando o grau passava para Ensino Médio completo em diante.
O que se vê, portanto, é um aumento progressivo da fome no país, com um agravamento no cenário pandêmico, o que impõe novos desafios. Parte da solução para esses problemas passa pela criação de políticas públicas de geração de emprego e renda que considerem as desigualdades regionais do país, além do fortalecimento do sistema de proteção social, que nos últimos anos tem sofrido com desfinanciamento progressivo[16].
Para acessar a pesquisa completa clique aqui.
Covid-19 e o Observatório História e Saúde – COC/Fiocruz
O Observatório História e Saúde COC/Fiocruz coordena o projeto intitulado “Covid-19: a pandemia e resposta social no contexto brasileiro”, que tem como objetivo analisar a pandemia de Covid-19 e a resposta social surgida no contexto brasileiro, com foco nas questões e ações relativas aos campos de ciência e da saúde. Um dos eixos da pesquisa trata de questões relacionadas à crise social decorrente da pandemia, com foco no agravamento do problema da pobreza e da fome e das políticas econômicas a elas relacionadas. Acompanhe as redes do Observatório para maiores informações e acesso aos resultados desse trabalho.
Campanhas
Tem gente com Fome Mães da Favela
Brasil sem Fome – Ação da Cidadania
Mutirão contra à fome – Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA/RJ
[1] Nutricionista, mestre em Saúde Coletiva (IMS/Uerj), bolsista PIDI do Projeto “Covid-19: a pandemia e resposta social no contexto brasileiro”
[2] Historiador, doutor em História das Ciências e da Saúde (PPGHCS/Fiocruz), bolsista de Pós-doutorado no PPGHCS/Fiocruz
[3] Jornalista, doutora em Letras pela PUC-Rio, Tecnologista em Saúde Pública da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz), onde atua no Departamento de Arquivo e Documentação. Mestre em Comunicação Social e Especialista em Comunicação e Imagem pela PUC-Rio
[4] https://portal.fiocruz.br/sites/portal.fiocruz.br/files/documentos/boletim_extraordinario_2021-marco-23-red-red.pdf
[5] https://exame.com/economia/desemprego-no-brasil-fica-146-e-atinge-14-milhoes-de-pessoas-diz-ibge/#:~:text=Desemprego%20no%20Brasil%20fica%2014,de%20pessoas%2C%20diz%20IBGE%20%7C%20Exame
[6] https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,brasil-tem-98-2-milhoes-de-pessoas-totalmente-imunizadas-contra-a-covid-19,70003864102
[7] https://g1.globo.com/politica/noticia/2021/03/31/apos-1a-reuniao-do-comite-da-covid-bolsonaro-diverge-de-queiroga-pacheco-e-lira-sobre-distanciamento.ghtml
[8] https://g1.globo.com/globonews/jornal-globonews-edicao-das-10/video/bolsonaro-o-brasileiro-tem-que-voltar-a-trabalhar-9397944.ghtml
[9] https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/06/pandemia-obriga-familia-a-pagar-aluguel-para-manter-casa-mas-morar-na-rua-por-comida.shtml
[10] https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/08/brasileiro-usa-auxilio-emergencial-para-comprar-comida-diz-datafolha.shtml#:~:text=A%20maioria%20dos%20brasileiros%20que,dinheiro%20principalmente%20para%20 comprar%20comida.&text=Outras%20respostas%20somaram%204%25%2C%20e,%C3%A0%20pandemia%2 0do%20novo%20coronav%C3%ADrus.
[11] https://brasil.elpais.com/economia/2020-12-21/fim-do-auxilio-emergencial-deixa-o-brasil-entre-o-medo-da-pandemia-e-do-desemprego-em-2021.html
[12] https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2021-10/trabalhadores-nascidos-em-maio-podem-sacar-auxilio-emergencial
[13] Valor calculado a partir da Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos Fevereiro de 2021 – DIEESE https://www.dieese.org.br/analisecestabasica/2021/202102cestabasica.pdf
[14] https://www.brasildefato.com.br/2020/03/30/covid-19-brasil-nao-tem-estoque-publico-de-alimentos-para-enfrentar-desabastecimento
[15] https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2021/03/fome-na-pandemia-moradores-de-favelas-ja-fazem-menos-de-duas-refeicoes-por-dia/
[16] https://brazil.unfpa.org/pt-br/news/sistema-%C3%BAnico-de-assist%C3%AAncia-social-%C3%A9-essencial-para-popula%C3%A7%C3%A3o-mais-vulner%C3%A1vel-no-enfrentamento
Este texto é uma versão atualizada da publicação “Fome no Brasil: a incerteza da comida na mesa em um país assolado pela Covid-19”, disponibilizada em 05/05/2021 no site da Casa de Oswaldo Cruz.
Como citar este texto
FREITAS, Gabriele Carvalho de; ARAÚJO NETO, Luiz Alves; D’AVILA, Cristiane. Fome no Brasil: a comida na mesa continua incerta em um país assolado pela Covid-19. Site do Observatório História e Saúde – COC/Fiocruz, 20XX. Disponível em: https://ohs.coc.fiocruz.br/posts_ohs/fome-no-brasil-a-comida-na-mesa-continua-incerta/#_ftn1. Acesso em: XX de xxx. de 20XX.