Com exatas duas semanas de mandato, o presidente estadunidense Donald Trump tem causado preocupação em campos como a saúde global, direitos humanos e meio ambiente. Em texto publicado no site do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz (CEE/Fiocruz), a doutora em Ciência Política Sonia Fleury realiza uma primeira análise dos impactos das novas decisões do novo presidente dos Estados Unidos, das quais destacamos a possível saída do país da Organização Mundial da Saúde e consequente escassez de recursos na cooperação internacional em saúde.
Leia um trecho abaixo:
O que esperar de um ano que começou com tanta insegurança? – por Sonia Fleury | Parte I
Sonia Fleury
O início do governo Trump já deixou claras suas posições e ações de desrespeito aos direitos humanos e às instituições democráticas, como no caso da negação do direito de cidadania às crianças nascidas em território dos Estados Unidos, o que fere a Emenda 14 da Constituição e está sendo objeto de disputa judicial. Ademais, centrando seu discurso na força e na virilidade, tomou medidas contrárias aos direitos reprodutivos e eliminou medidas progressistas como a identificação não binária. Tornando-se símbolo do autoritarismo no mundo, foi sufragado pelo voto popular, conseguindo apoio inusitado nas comunidades de latinos e negros. Isso decorre de uma conjuntura na qual a falta de perspectivas e a insegurança econômica e social tornam as classes médias baixas presas fáceis dos discursos de líderes que pretendem resgatar valores tradicionais e lhes oferecem promessas de retorno a uma situação idealizada.
Trump representa uma séria ameaça em relação ao aquecimento global, ao retirar o país do Acordo de Paris – o tratado internacional sobre mudanças climáticas de 2015 – e decretar emergência energética visando impulsionar o setor de petróleo e eliminar as medidas do New Green Deal, como a obrigação de produção de carros elétricos. Além de aumentar os riscos dos eventos climáticos extremos, no país cuja produção de CO2 per capita já é a maior do mundo, certamente terá um impacto negativo na COP 30, a ser realizada em Belém, sob a presidência do Brasil, dificultando a construção dos acordos necessários para o avanço de ações de combate às mudanças do clima.
O anúncio da saída dos EUA da OMS terá consequências no financiamento da organização já que são o maior doador individual (18% do orçamento) além de financiar outros programas, por exemplo, 75% para HIV e doenças sexualmente transmissíveis e mais da metade das contribuições para o combate à tuberculose. Mais do que o impacto financeiro, que certamente será muito mais sentido pelos países mais pobres e que dependem desses programas, a saída dos EUA da OMS terá consequências que afetarão a saúde global, com grande impacto também dentro do próprio país. Como membro fundador da OMS, sua retirada significa minar o prestígio do sistema das Nações Unidas, acentuando a tendência a sua desimportância como mecanismo de construção de consenso e implementação de programas e ações para solução de problemas para benefício de toda humanidade.
Trump escolheu para comandar o Department of Health and Human Services (HHS), o equivalente ao nosso Ministério da Saúde, tendo como missão supervisionar as principais agências de saúde do país, Robert F. Kenedy Jr, um negacionista que segue defendendo que vacinas provocam autismo, em um país onde a cobertura vacinal já é baixa, atendendo a pressões empresariais. Também pretende recomendar às autoridades públicas locais acabar com a fluoretação da água. Ambas as posições, terão impactos severos na deterioração das condições de saúde da população estadunidense. Segundo Paulo Capel “o negacionismo, em suas diferentes expressões, das vacinas às mudanças climáticas, não é, portanto, desinteressado. Não é apenas produto de notável ignorância. É negócio”.
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Cooperação internacional é um dos temas de estudo no Observatório História e Saúde, e em nosso site podem ser encontrados tanto materiais sobre recomendações internacionais para a gestão em saúde desde a década de 1950, quanto artigos mais recentes a respeito da internacionalização da saúde e o papel da OPAS e OMS. Confira nossa relação de documentos da OPAS que tratam das redes de atenção à saúde aqui. Buscando em nosso site por OPAS você encontra artigos dos últimos 20 anos que se debruçam sobre o tema.
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